22 de set. de 2008

O profeta da crise

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Em 7 de setembro de 2006, Nouriel Roubini, 50 anos, professor de economia da New York University, em uma palestra no Fundo Monetário Internacional, anunciou que os EUA enfrentaria uma crise imobiliária, um impacto nos preços do petróleo e um preocupante declínio da confiança do consumidor, ou seja, uma recessão.

Diante de uma plateia incrédula, Roubini destilou eventos desanimadores que viriam: mutuários inadimplentes, trilhões de dólares em títulos vinculados a financiamentos de imóveis se derretendo, e o medo paralisando o sistema financeiro global.

Os economistas acharam exageradas as previsões e preferiram creditar as profecias catastróficas à conhecida casmurrice do professor de doutores da New York University.

Em 2008 os concessores de empréstimos subprimes começaram a pedir falência, os hedge funds entraram em queda, o mercado de ações entrou em colapso e a crise imobiliária se estabeleceu.

O Federal Reserve, para remediar o que não preveniu, dispôs linhas de crédito para bancos de investimentos e corretoras de valores: os economistas, com as providências dos FED,  anunciaram o fim da crise. Roubini contra atacou: no banzeiro da crise viriam ondas de falências corporativas, colapso do mercado imobiliário e bancarrotas.

Meses depois, um dos maiores bancos da Califórnia, o IndyMac foi liquidado: uma das maiores falências do gênero na história americana.

Roubini virou o profeta da economia americana: foi chamado pelo Congresso para dar explicações sobre a essência da crise e ovacionado no Fórum Econômico Mundial de Davos.

Em meados de julho o Presidente Bush anunciou que o pior já passara e que a os EUA voltariam a crescer de forma sólida.

Roubini avisou que o monstro estava apenas buscando fôlego para bufar de novo. Advertiu que ou o governo ajudava as hipotecas de alto risco ou os as instituições que detinham o controle destes empréstimos iriam a pique.

Ou nacionalizam os bancos ou as hipotecas, senão, todos estarão condenados”, disse ele. O que Roubini queria dizer é que ou o governo colocava dinheiro de verdade na ciranda virtual que se tornou o mercado de títulos, ou os EUA iriam torrar.

Esta semana, de novo, a profecia do Professor Roubini se fez: mais uma rebordosa atingiu os EUA, causando a quebra de importantes instituições financeiras.

E aí, o que ninguém poderia imaginar aconteceu: os EUA, o país mais privatizado do mundo, resolveu seguir o conselho de Roubini e estatizar os prejuízos da crise, ao anunciar que vai colocar dinheiro de verdade para arrumar a casa.

O plano prevê aporte de aproximadamente um trilhão de dólares para ajudar as instituições financeiras a saírem da confusão em que se meteram.

Roubini disse que é pouco: ou o Tio Sam mete a mão no bolso e dispõe de dez vezes isto, ou tudo não vai passar de um paliativo.

Com tudo que já vimos, acho melhor o dono do FED dar ouvidos ao Professor e usar de vez a solução ortodoxa de sempre: arcar com os prejuízos da omissão governamental, que nunca regulamentou o mercado financeiro como devia.

15 de set. de 2008

Brasil, classe média

Brasileiros em uma feira de automóveis: foto que ilustra a matéria da The Economist. A afirmação do título deste artigo é uma matéria da respeitada publicação britânica, The Economist.

A matéria, lavrada na edição da sexta-feira, 12.09, destaca o crescimento da classe média no Brasil, que hoje já ultrapassa metade da população.

A revista, baseada em dados da Fundação Getúlio Vargas, versa que o "O Brasil, antes notório por seus extremos, é agora um país de classe média".

Prossegue a reportagem que "Esta escalada social é vista, principalmente, nos centros urbanos do país, revertendo duas décadas de estagnação econômica iniciada nos anos 80."

O economista Marcelo Neri, da FGV, é citado pela revista, quando esta aponta as duas principais razões para o crescimento da classe média: a melhora no nível de educação, com os alunos permanecendo nas escolas por mais tempo do que no início dos anos 90, e a migração de empregos do mercado informal para a economia formal.

A matéria constata uma aceleração considerável no ritmo de criação de empregos formais: 40% mais empregos formais foram criados nos últimos 12 meses, até julho de 2008, do que no mesmo período do ano passado.

A The Economist chama tal proeza de “um recorde em si mesmo”.

Um soco na boca do estômago daqueles que criticam a transferência de renda através das bolsas criadas por Lula: a mais respeitada publicação capitalista do planeta faz elogio à política de bolsas do Governo Federal.

Diz a matéria que a transferência de renda para famílias pobres é um ponto positivo que diferencia o Brasil de emergentes como a Índia e a China: o Brasil tem diminuído as desigualdades sociais apesar de ostentar um crescimento menor.

A reportagem revela um dado interessante para os varejistas: a nova classe média brasileira, apesar de não procurar as lojas caras voltadas para um mercado mais rico, também não quer comprar em lojas que pareçam baratas.

Outro dado interessante revelado pela The Economist: as novelas brasileiras são as responsáveis pelo estabelecimento do padrão de gosto em moda e beleza.

A The Economist faz também uma incursão no perfil político partidário da nova classe média nacional.

Afirma a reportagem que a classe média tradicional é eleitora preferencial do PSDB, que levou FHC e os tucanos ao poder por 08 anos.

A nova classe média, todavia, é preferencialmente petista, pois, aqueles que subiram das classes C e D e experimentaram a ajuda do governo neste caminho, são gratos ao Presidente Lula.

A revista conclui a reportagem com um cáustico, comentário em relação ao Partido dos Trabalhadores: versa sobre a ironia política que é ter que creditar a um partido de esquerda em sua origem, o mérito de ter conduzido o Brasil a uma sólida abertura comercial com o mundo, inserindo-o na realidade da globalização econômica que tanto criticava.

9 de set. de 2008

Menos carne

carne[1] Na noite desta segunda-feira, 08.09, em Londres, Rajendra Pachauri, Presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU, fará uma proposta tão recorrente quanto incômoda: as pessoas deveriam considerar comer menos carne como uma forma de combater o aquecimento global.

A proposta do Senhor Pachauri  se baseia em números da própria ONU, que sugerem que a produção de carne lança mais gases do efeito estufa na atmosfera do que o setor do transporte: a indústria automobilística está em estado de graça..

Imediatamente após o anúncio da proposta a ser feita, a União Nacional dos Fazendeiros da Grã-Bretanha afirmou que medidas vêm sendo tomadas e que as emissões de metano de fazendas estão caindo: a nota  não disse quais as tais medidas.

Mas, a Organização da ONU para Agricultura e Alimentos, FAO, estima que as emissões diretas da produção de carne correspondem a 18% do total mundial de emissões de gases do efeito estufa.

O número da FAO, de 18%, inclui gases do efeito estufa liberados em todas as etapas do ciclo de produção da carne: abertura de pastos em florestas, fabricação e transporte de fertilizantes, queima de combustíveis fósseis em veículos de fazendas e as emissões físicas de gado e rebanho.

Isto chega a ser um paradoxo alimentar: estamos nos envenenando com dióxido de carbono para comer um bife.

Pachauri  argumenta que a mudança de hábitos alimentares é uma das opções para reduzir as mudanças climáticas.

Argumenta ainda Pachauri  que pesquisas no mundo inteiro têm mostrado que as pessoas estão ansiosas com a questão ambiental e começam a se preocupar com o que elas estão contribuindo para o desequilíbrio climático.

Por isto, alertar para que percebam que podem contribuir para o reequilíbrio simplesmente mudando o que está no seu prato pode ter um efeito resolutivo considerável.

Pachauri afirma que há várias possibilidades de redução dos gases de efeito estufa associados aos animais em fazendas, que vão de ângulos científicos, como as variedades de gado geneticamente criadas para produzir menos metano em flatulências, até reduzir a quantidade de transporte envolvido, comendo animais criados localmente.

Ao fim, Pachauri  aponta o dedo para nós aqui, ao observar que a maior fonte mundial de dióxido de carbono vindo da produção de carne é o desmatamento, principalmente de florestas tropicais, que deve continuar enquanto a demanda por carne crescer.

1 de set. de 2008

República grampeada

Observador silencioso - Alfred Gockel. Clique na imagem para seguir o link. A revista Veja publicou matéria afirmando que foi encontrada escuta ambiental no gabinete do Ministro Gilmar Mendes, Presidente do Supremo Tribunal Federal.

Tão grave quanto, emenda a publicação: agentes da Agência Brasileira de Inteligência, ABIN, grampearam, ilegalmente,  todos os telefones de Mendes.

Provando a afirmação a revista transcreveu a degravação de uma conversa entre o Ministro Mendes e o Senador Demóstenes Torres, cujo teor, os dois grampeados confirmaram.

O Presidente do Supremo reagiu indignado: “Acho que o próprio presidente da República é chamado à sala. Acho que ele precisa realmente tomar previdências, e encerrar definitivamente isto que parece ser a instauração de um estado policial no Brasil”.

O Senador Torres foi no mesmo tom: “O que está acontecendo é desastroso para a democracia. A ABIN, um grupo criado para detectar focos de guerrilha, passou de todos os limites e está espionando o Legislativo e o Executivo indevidamente. Isso é gravíssimo. O fato é ligado ao presidente Lula e está descontrolado, ele tem que retomar esse controle , porque é uma questão de harmonia dos poderes”.

O Presidente do Senado Federal, Senador Garibaldi Alves, outra suposta vítima da febre de escutas telefônicas que virou moda no Brasil, acompanhou a fala: “Se está querendo implantar um estado policial se agredindo de uma forma vil dois presidentes de poderes da República e isso não pode acontecer em estado democrático nenhum”.

O Senador do PT, Aloizio Mercadante, solidarizou-se: “Isso é inaceitável. Tem que apurar quem gravou e por que gravou. É uma violência gravíssima do direito à comunicação. Seria uma violência com qualquer cidadão e é com o presidente do STF e com um senador da República”.

A ABIN escamoteia as evidências: tange a conversa para o acostamento, ao argumentar que o fato de Gilmar Mendes e Demóstenes Torres confirmarem a existência do diálogo, não significa que houve grampo, e se houve que ele tenha sido realizado por ela.

Mas, pelo sim, pelo não, prometeu abrir sindicância interna para apurar possível envolvimento de servidores em espionagem ilegal do gabinete do Presidente do Supremo.

O Planalto, através do próprio Presidente Lula, na tentativa de jogar uma pá de cal na crise institucional à vista, determinou ao Diretor-geral da ABIN, Paulo Lacerda, que demita sumariamente os responsáveis pela escuta ilegal.

De acordo com a Veja, a ABIN grampeou o Presidente Mendes, por ocasião da sua decisão de conceder Habeas Corpus a Daniel Dantas, em função da sua prisão na Operação Satiagraha.

A matéria da Veja foi entregue por um funcionário da própria ABIN, que confidenciou serem os grampos ilegais uma rotina  na agência.

Segundo o dedo duro da ABIN, pessoas que já foram grampeadas pelo seu setor, são nomes conhecidos na República: o Chefe de Gabinete do Presidente Lula, Gilberto Carvalho, a Ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil, José Múcio, das Relações Institucionais, o Presidente do Senado, Garibaldi Alves, os senadores Arthur Virgílio, Álvaro Dias, Tasso Jereissati e  Tião Viana, além do Presidente do STF, Gilmar Mendes e o ex-presidente da mesma corte, o Ministro Marco Aurélio Melo.

São os velhos vícios da ditadura militar fazendo escola em pleno Brasil democrático.

Estava cheio de razão o Ministro Múcio, ao afirmar, meses atrás, que os telefones brasileiros eram uma imensa rádio comunitária.