28 de abr. de 2008

Peter Park não é Senador

O Homem Aranha A criação de Stan Lee, O Homem Aranha, é um dos mais bem sucedidos quadrinhos da história e um dos mais lidos em todo o mundo.

Stan criou um super-herói humano, com todos os dramas e dúvidas da adolescência, que, empolgado com a descoberta dos seus super poderes, aprende do seu moribundo Tio Ben, uma lição que o acompanhará o resto da vida: "Com grandes poderes vêm grandes responsabilidades".

Foi esta frase que fez o jovem Peter Parker, na pele do Homem Aranha, iniciar o seu incansável combate ao crime na peculiar cidade de Nova York.

Um senador da República tem super poderes: representa um estado da Federação; é a voz daquele Estado na República; encarna a organização política do povo de um determinado território e é, ao mesmo tempo, o moderador da vontade popular que se faz através dos representantes daquele povo, que são os deputados.

No rastro da operação “Arco de Fogo”, palanques se armaram no município de Tailândia e discursos paradoxais foram feitos: é de uma dialética estranha a fala daqueles que se dizem contra o crime mas defendem um tempo para que ele cesse.

O tempo demandado, é o necessário para que os que vivem da atividade ilegal recebam do Estado a alternativa legal: tal asserção, se permitida, têm conseqüências terríveis se aplicado o princípio constitucional da igualdade de direitos para as outras atividade ilegais que o Estado deve combater.

Em um destes palanques subiu o Senador Flexa Ribeiro e, à guisa de mostrar a sua indignação com a providência da República contra a recorrente ilegalidade da atividade madeireira, prometeu trancar a pauta do Senado da República até que esta suspenda a operação.

A audiência, com certeza, adorou a bravata: alguns por acreditarem que isto seria possível, outros por confiarem que o esforço seria pelo menos tentado.

É claro que tudo não passou de adolescência do Senador Ribeiro, que agiu como o jovem Peter Parker: empolgado com o seu super poderes.

Sabe ele que, mesmo que intentasse consumir a fala, os seus super poderes não seriam suficientes para constranger a República a parar de esgrimir o crime que a “Arco de Fogo” quer combater.

Ao que parece, o Senador Ribeiro nunca leu o “Homem Aranha”. Tão pouco viu o primeiro filme da série, onde Cliff Robertson, no papel do Tio Ben, antes de morrer, admoesta um acabrunhado Peter Parker: “Peter, com grandes poderes vêm grandes responsabilidades".

O jovem Parker entendeu que a sua grande responsabilidade seria combater todos aqueles que lançassem mão de atividades ilegais.

Seria ótimo para a República se os seus senadores ouvissem o Tio Ben e começassem a combater o crime, ao invés de ameaçarem parar o Senado para que a delinqüência continue a perpetrar.

21 de abr. de 2008

O brado dos tambores

tambores[1] O General Heleno, Comandante Militar da Amazônia, ao participar do Seminário Brasil, Ameaças a sua Soberania, no Clube Militar do Rio de Janeiro, desqualificou a política indígena brasileira.

A fala do general se fez em crítica à demarcação contínua da Reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, considerando tal disposição como uma ameaça à soberania nacional, por esta se encontrar em área de fronteira.

O militar, para dar substancia a sua opinião, soltou uma frase de efeito à platéia: "Não sou da esquerda escocesa, que, atrás de um copo de uísque 12 anos, sentada na Avenida Atlântica, resolve os problemas do Brasil inteiro. Já visitei mais de 15 comunidades indígenas, estou vendo o problema do índio."

O Presidente da República não gostou da opinião do General e determinou ao Ministro da Justiça que o chamasse às falas.

Os clubes militares publicaram notas de apoio ao General Heleno. A nota atrevida veio do Tenente-Brigadeiro Ivan Frota, que preside o Clube da Aeronáutica.

A nota assinada por Frota ameaça a Presidência: para quem quiser assim entender, Frota avisa que as Forças Armadas estão prontas para reeditar março de 1964 caso o Presidente ouse reprimir o General Heleno.

O General Heleno pode manifestar a sua opinião a quem quiser e como quiser, mas, esta coisa de dizer que o Exército serve ao Brasil e não ao governo é apenas mais uma frase de efeito: os governos eleitos democraticamente é que têm a legalidade e a legitimidade para falar pelo Brasil. Como o Presidente Lula foi eleito pelo povo, O General, que jurou respeito à lei e a ordem, deve-lhe continência e ponto final.

Não se deve desprezar a opinião do General Heleno sobre reservas indígenas em áreas de fronteira: esta é uma discussão que o Brasil não deveria passar ao largo.

Todavia, o conhecimento de causa do General acaba exatamente no que tange à segurança nacional. Ele achar que conhece a causa indígena só porque já visitou 15 aldeias é uma bravata desnecessária: o General conhece a causa indígena com a mesma profundidade que os antropólogos na FUNAI conhecem soberania nacional.

Quanto ao Tenente-Brigadeiro Frota, tudo o que os soldados saudosos da ditadura militar podem ainda fazer é soltar notas malcriadas a partir de presidências de clubes militares, para dar alguma satisfação à parte da tropa que acha que o Brasil será invadido no próximo alvorecer e exultar os corações dos civis que lustravam as botas dos generais com as suas respectivas línguas.

Não procede também a desculpa de que a caserna estranha a reprimenda de Lula ao General Heleno por este ter criticado a política indigenista ao passo que tem aturado as críticas de membros do governo à política econômica.

Um civil fazer críticas dentro do governo é próprio da dialética democrática: ele não tem uma tropa ao seu comando, armada até os dentes, doida para fazer das manobras algo mais que simples fumaça.

As democracias limitam os militares aos quartéis como salvaguardas de si mesmas: críticas de militares sempre soam como ameaça.

14 de abr. de 2008

Entrevista com Delfim

Delfim Neto. Clique na foto para seguir o link. A mais recente edição da revista Poder publicou uma entrevista com Delfim Neto, que está às vésperas de completar 80 anos.

O ex-ministro de todas as pastas continua sendo uma das vozes ouvidas por 10 dentre 10 economistas brasileiros.

Alguns trechos da entrevista merecem destaque:

Sobre Lula:

Acha que Lula tem uma inteligência privilegiada e que o Presidente salvou o capitalismo brasileiro ao aumentar a igualdade de oportunidades.

Defende os programas de distribuição de renda, alegando que estes são fundamentais para “dar moralidade ao capitalismo”.

Afirma que os programas sociais de Lula são um assistencialismo necessário e funcionam como uma porta de saída para os pobres à medida que vinculam o recebimento com educação, o que é uma mudança de concepção.

Elogia o PAC como a retomada de investimentos públicos em infra estrutura.

“O Lula é um sobrevivente. O Lula é o Darwin andando. É um processo da seleção natural mesmo, e com uma vantagem: nunca leu Karl Marx”.

Sobre FHC:

Recorda que FHC legou um Brasil falido em 2002, com inflação de 30% ao ano, exportações crescendo a 4,5%, a dívida externa crescendo 6,5% ao ano, e meros US$17 bilhões de reservas.

Com as circunstâncias favoráveis bem aproveitadas por Lula, as reservas são de US$193bilhões, as exportações crescem 18% ao ano e as importações crescem 45% ao ano.

Continua a desancar FHC: “o Fernando gastou um tempo imenso na reeleição e com métodos heterodoxos. O tempo que ele poderia ter aproveitado para fazer o desenvolvimento, ele aproveitou para se reeleger. E o que é pior: pra nada. Porque o segundo mandato foi mais lamentável que o primeiro”.

2010 e a Economia:

Ensina que desde os anos 40 estudos empíricos mostram que o fator mais importante na eleição é o econômico.

Imagina que Lula terá grande influência na sua sucessão se o Brasil continuar crescendo 5% a 6% ao ano, “como tudo indica que vai continuar”.

Avisa que dois fatores podem abortar o crescimento: “a crise energética e a crise em contas correntes”. Mas, acha que o governo está providenciando para que tais fatores não ocorram.

Os presidenciáveis:

Enumera Ciro Gomes, José Serra, Aécio neves, Dilma Rousseff e Patrus Ananias.

Elogia Dilma como a mais eficiente ministra do governo, mas adverte que ela nunca foi testada nas urnas.

Laureia Aécio e Serra como administradores competentes, embora faça ressalvas ao partido de ambos: “o PSDB é uma coisa insondável”.

Diz que o Ciro vai pela tangente: “o Ciro é uma coisa estranha, de vez em quando ele tropeça nele mesmo. Se não tropeçar nele mesmo, a coisa do Ciro é muito mais séria do que parece. Ele tem uma mensagem que fala à sociedade”.

O Brasil no mundo:

Acha que o Brasil continuará crescendo entre 5% e 6% ao ano, mas poderá ter problemas com uma eventual queda dos preços dos produtos agrícolas e minerais que são exportados.

Achincalha a política da Organização Mundial do Comércio que quer legar ao “Brasil, a agricultura e o minério, para a Índia, os serviços, e para a China, a indústria”.

Aconselha que o Brasil não se deve submeter a esta política: “nós vamos ter, daqui a 25 anos, de 240 a 250 milhões de habitantes, teremos de dar emprego para 140 milhões de brasileiros entre 15 e 65 anos, ninguém vai fazer isso com exportação agrícola e mineral”.

Direitos adquiridos:

Reconhece que a defesa do meio ambiente é um negócio definitivo.

“Eu, quando era moleque nas ruas do Cambuci, matava passarinho e comia o passarinho. Hoje, qualquer criança, se você contar isso, tem de ir para um psiquiatra”.

Aponta como conquista irreversível o direito dos trabalhadores.

Real X Dólar:

Conta que quando perguntaram a Warren Buffett, como ele ganhou US$100 milhões com o real, ele respondeu que foi porque tinha uns idiotas no Brasil.

Desmistifica os juros altos como sendo um sofisma inventado no primeiro mandato do FHC, que elevou os juros reais a 22% para manter o real valorizado.

A explicação era que se o País não pagasse a taxa os bancos brasileiros não financiariam a dívida pública.

“Vão aplicar onde? Vão ter de aplicar no setor privado a taxas ainda mais baixas. Tudo isso é uma das maiores mistificações em nome da ciência econômica já construídas”.

Aplicando dinheiro:

Confessa que nunca aplicou em ações, mas, reconhece que, no longo prazo, a bolsa é a melhor aplicação.

“Quem aplica em bolsa tem de estudar, tem de prestar atenção. Quem não tem tempo pra isso é melhor comprar um fundinho.

Leituras:

Afirma que para entender o mundo é preciso entender a economia que o faz girar.

Para tal, aconselha dois livros de Adam Smith: Teoria dos Sentimentos Morais e A Riqueza das Nações.

Debita à imoralidade de funcionamento do sistema econômico a sua maior crise.

“O sistema financeiro nasceu para servir a economia real, mas ele se apropriou da economia real. Qual é a única regra moral do sistema financeiro? O maior lucro possível, no menor tempo possível, para obter o maior bônus possível e correr para aplicar em papéis do Tesouro americano”.

7 de abr. de 2008

Presidentes vestem Armani

armani[1] O parlamento brasileiro se tem furtado a discutir as grandes questões nacionais e apequenou-se nas alcovas do planalto.

A situação e a oposição, em sentido diferente, acabam marchando em uma mesma direção: aquela se resumiu a advogar as querelas do Poder Executivo e esta teima em transformar o parlamento em uma delegacia de polícia.

Os deputados e senadores têm perdido um bom tempo em CPIs que apenas traduzem a vaidade de uns e o ódio de outros.

Ao cabo, o material colhido nestas comissões vai parar em alguma prateleira empoeirada.

O mais recente fetiche da oposição é a CPI dos cartões corporativos.

Não deveria haver CPI para isto: os desvios de uso do instituto deveriam ser apurados em processos administrativos nos respectivos órgãos onde foram cometidos.

A Corregedoria Geral da União tem competência institucional para apurar responsabilidades, estabelecer sanções e, principalmente, recomendar mudanças nas normas de uso, para que se aprimore a detecção dos desvios.

Quando o Parlamento toma para si as atribuições que são corriqueiras da máquina pública, não há aí um foco específico no problema e nem uma vontade republicana de solução.

O que a oposição quer, neste episódio, é praticar o seu esporte preferido: tentar arranhar o governo na esperança de ver-lhe o sangue escorrer.

A CPI dos cartões corporativos não está interessada em saber quem desviou o que no uso do plástico. Tão pouco tem o foco de aconselhar mudanças no manuseio: quer escancarar politicamente à nação, qual a marca do protetor solar que a Primeira Dama usa e que tipo de vinho o Presidente bebe.

A situação, ao invés de enfrentar os caninos da oposição com um discurso focado na pertinência dos gastos – a Presidência da República tem estas prerrogativas – esconde-se na ampliação malversada do sigilo da informação.

Faz pior ainda, a situação: mune-se de dossiês com gastos similares do presidente anterior, onde se lê procedimentos semelhantes, na mais pura tradução do sujo às voltas com o mal lavado.

Quanto a mim, não me apetece mal saber que a Presidência da República usa o meu dinheiro para tomar champanhe e oferecer caviar aos seus convivas: servir bem e ser bem servido é uma prerrogativa institucional da Presidência.

Não posso achar que está correto o discurso de tamborete de que é uma vergonha o Presidente tomar Perrier enquanto o povo não tem água na torneira: isto pode ter algum efeito eleitoral, mas, não é o foco que a República precisa para por água na torneira do povo.

Precisamos sair deste lugar comum de achar que o Presidente tem que andar de GOL pelo mundo, e que a Primeira Dama deve comprar os seus terninhos no brechó: o Brasil já está maior que isto.

O Parlamento tem que parar com mania de delegacia de polícia e discutir, para resolver, as grandes questões nacionais, como a Reforma Política e Tributária.

O Brasil, como a oitava economia do mundo, chegou a um teto de difícil ultrapassagem.

Temos agora a responsabilidade de deixar para trás grandes potências, cujos líderes servem caviar aos seus convidados e vestem Armani, e cujas primeiras damas vestem Versace, calçam Prada e portam bolsas Gucci. 

Não vale mais, para nós, esta insensatez de querer que o Presidente Lula vá de uniforme de metalúrgico para o Alvorada: este discurso torto não vai conseguir desempenar os fatos que queremos mudar.