1 de jan. de 2007

Folhinha do ano

folhinha[1]

Eu não sei se ainda se vende aquela folhinha do Sagrado Coração de Jesus, que era pendurada na parede e, dia após dia, tinha-se que arrancar uma folha.

Minha mãe, devota juramentada da ordem do Sagrado Coração, não deixava faltar a folhinha em casa.

A folhinha tinha três funções: a cronológica, que nos dizia o dia da semana e do mês, a religiosa, pois ali estava a imagem serena de Jesus Cristo a nos ouvir as preces, e a educativa, pois atrás da folha a ser arrancada, havia informações diversas sobre os mais variados assuntos.

Um dos meus prazeres do dia era arrancar a folhinha, o que descortinava o novo dia, e ler o que tinha atrás: eu adorava quando eram piadas ou curiosidades bizarras.

Mas o mais gostoso mesmo era arrancar a última folha do ano: isto era esperado o ano inteiro, pois, a cada ano, um de nós fazia o trabalho.

Ato contínuo, ido o ano velho junto com a última folha, chegava o ano novo, com a fixação da nova folhinha na parede.

Ai daquele que ousasse passar pela folhinha sem se benzer em respeito à imagem do Sagrado Coração de Jesus.

Este ritual se perdeu em alguma passagem de ano que, embora eu tente certas horas buscar nos escaninhos da minha memória, eu não consigo lembrar: não sei qual o último ano que a mim coube arrancar a última folha da folhinha do ano da parede.

O interessante disto tudo, é que estes fatos se deram em um século que já acabou: talvez nós ainda não nos tenhamos dado a devida conta de que estamos tendo o privilégio de termos vivido e presenciado, uma passagem de século.

Há um fato nestes seis passados anos do século XXI: o Brasil ainda não chegou ao futuro que nos foi prometido desde o século passado.

Mas, não podemos desesperar: esperar é o que temos feito e é o que devemos continuar fazendo.

No entanto, a espera não pode ser aquela de estar "sentado à beira do caminho", cantada por Roberto Carlos, grande sucesso no século passado, e sim a espera pro ativa que, também no século passado, cantou o Geraldo Vandré, na sua bela "Para não dizer que não falei de flores".

Mantenhamos a fé no futuro fazendo a construção do nosso presente. O futuro é o ideal humano. O presente ditoso à mesa, é privilégio de uma minoria no mundo.

Devemos manter, como arrego de um presente eventualmente magro, a dádiva de um futuro promissor, e é exatamente a busca disto que renova, a cada ano, as esperanças dos homens.

Feliz 2007!

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